sábado, 31 de dezembro de 2022

Volkswagen Quantum CD 1985/1986

Em 1984, a Volkswagen deu um passo bastante importante ao lançar o Santana em nosso mercado. Maior do que o Passat (a ponto de ser um Voyage de Itu, para os sarcásticos), o novo modelo - idêntico ao vendido na Europa - veio na medida para concorrer com o Monza, outro médio da Chevrolet que vendia muitíssimo bem. Inicialmente oferecido apenas na versão cupê (as portas traseiras demoraram uns meses pra chegar), o Santana era equipado pelo correto motor AP 1800 movido a álcool e a gasolina e oferecia três versões de acabamento.

A CS - confort silver - era a mais básica e dispunha de poucos opcionais, mas sem significar um carro terrivelmente mal acabado; a CG - confort golden - era a intermediária e poderia receber opções como o ar-condicionado; por fim, a CD - confort diamond - topo de linha e que poderia receber lavador de faróis (no melhor estilo do Corcel II) e muitos outros itens de de conforto que normalmente se espera em um veículo mais caro daquela época, até mesmo o travamento central - e pneumático - das portas já vinha de série.

O Santana mais básico não tinha muitos adornos, mas ainda era bem aceitável e o acabamento interno convencia, notem o vidro traseiro basculante, coerente e necessário.

O esmero no acabamento não era ao acaso: seu concorrente, o Monza, dispunha da versão standard e da SL/E; esta, a topo de linha, deixava algo a dever no acabamento geral (materiais, inclusive) e por isto era muito necessário que a Volks adotasse um padrão bom nas terminações e nos revestimentos para ter mais um argumento ao dono de Monza conhecer Santana. Mas havia um porém: o custo do novo Volkswagen não poderia ser muito alto, pois ai o interessado poderia partir para um Opala Diplomata (o flagship da marca americana naquele tempo) ou se endividar de vez e abraçar um Alfa Romeo 2300 (bem mais caro).

A peça publicitária é de 1985, mas a preocupação com o preço era evidente: não poderia ser muito caro para não avançar nas faixas mais altas de preço da Chevrolet.

O Santana vendeu bem, obrigado. E Quantum foi outro duro golpe na Chevrolet: a perua da fábrica alemã se gabava de seu projeto milhas mais moderno e eficiente, além do par extra de portas na traseira. A resposta da GMB poderia ter sido melhor, mas, como ninguém quis produzir em série a desejável Caravan com quatro entradas, trataram logo de apresentar a versão Diplomata, para que o comprador de peruas médias pudesse ter a opção de maior luxo e assim não pensar muito na concorrência.

Apesar de Opala Diplomata estar disponível desde 1979, a Caravan demorou alguns anos para receber a versão mais cara de acabamento. Quantum foi decisiva para o upgrade, certamente.

O contragolpe mais lógico contra a Chevrolet seria a Quantum CD, certo? Sim, tanto que a Volkswagen preparou alguns veículos pré-série e os exibiu em seus catálogos para o ano de 1986, todos digitalizados pela Anfavea, a quem sempre agradecemos:




Não é difícil de perceber que a Quantum CD oferecia o mesmo pacote de amenidades do Santana CD, a começar pelas rodas de liga leve, os tecidos mais nobres no estofamento, profusão de cromados, o lavador dos faróis (apenas nas unidades sem o ar-condicionado), vidros climatizados e outros detalhes. Era mesmo uma concorrente muito forte para a Caravan Diplomata, como podemos ver do próximo catálogo:



Disse antes que eram exemplares pré-série porque não há notícia de que alguma Quantum CD foi faturada em uma concessionária para um comprador comum; basta que se note o catálogo acima, no qual há a foto de uma perua sem encostos de cabeça no banco traseiro, equipamento indicado no anverso e que não estava presente na época das fotos. Típico dos pré-série.

Sim, a fabricante pensou muito seriamente em ter a Quantum CD e a anunciou em seus catálogos, mas não foi muito além disso. Há resposta pra isso? Bem, talvez a hipótese mais plausível aos meus olhos é a questão do custo, do preço final.

Não podemos esquecer que em 1985/1986 a economia ia muito mal. Basta lembrar que a inflação acumulada no ano de 1985 ultrapassou a barreira dos 240% e isso prejudicava sobremaneira a venda de tudo o que fosse planejado, cenário não resolvido pelo ambicioso Plano Cruzado. Vender carros era duro e carros caros era mais terrível ainda... Então, se a Quantum custasse muito caro, certamente não valeria a pena ser vendida.

Vou até a minha coleção de Motor-3 e folheio a edição de janeiro de 1986. Um Fusca álcool custava Cr$ 32.091.504,00 (digo por referência do veículo mais barato); o Santana CS quatro portas álcool seria seu por Cr$ 69.433.262,00; o Santana CG álcool quatro portas era vendido por Cr$ 86.599.158,00; o CD álcool custava Cr$ 102.277.981,00. A Quantum CS álcool sairia por Cr$ 75.116.587,00 e a CG álcool por 91.303.445,00. São preços de veículos sem opcionais.

Em uma conta bem simples, a Quantum custava seis milhões de cruzeiros a mais do que o Santana da mesma versão; se essa diferença for realmente a mesma, poderemos estimar que a Quantum CD sem opcionais sairia por algo perto de Cr$ 108.000.000,00, isto é, um pouco mais cara do que a Caravan Diplomata com motor de quatro cilindros a álcool (seria sua por Cr$ 107.293.820,00), embora mais barata do que a Diplomata com motor seis cilindros álcool (Cr$ 115.333.056,00). 

Vou além: se a gente for ver quanto custavam as Caravan com motor de quatro cilindros álcool, a standard seria sua a partir de Cr$ 61.252.201, a Comodoro custava Cr$ 71.117.835,00. Grosso modo, as Caravan se equivaleriam às Quantum CS e CG, estas mais baratas (embora com ampla lista de opções). A Caravas Diplomata tinha um preço muito superior às demais, mas os equipamentos de série eram muitos, algo que a Quantum talvez não pudesse oferecer.

Fora que vender um carro custa dinheiro: ter uma opção no catálogo pressupõe custos e estoque. Talvez alguém fez um estudo de custos e de projeções de vendas e os números de estimativa de lucro não devem ter sido muito promissores; conforme o livro "Clássicos do Brasil - Opala", de Paulo César Sandler, a Chevrolet vendeu exatas 1.039 Caravan Diplomata em 1985 e outras 2.943 no ano seguinte. Num mercado retraído, talvez a Quantum CD não vendesse tudo isso...

Tudo isso são conjecturas de uma mente febril e estou muito aberto às críticas e aos comentários dos que me honram com sua visita. Mas, ao que me parece, o custo de fabricar uma Quantum CD não era vantajoso. E só em 1987 a Volkswagen, ao mudar a nomenclatura de toda a sua linha, finalmente trouxe o acabamento mais caprichado à perua, agora Quantum GLS. Então, se você ver uma Quantum CD por ai, não se assuste e nem duvide muito: talvez seja um pré-série sobrevivente...

7 comentários:

  1. De vez em quando eu ainda vejo algum Santana quadrado em bom estado de conservação, mas o que me chama a atenção é a maioria dos que ainda estão bons é com só duas portas. Quantum está ficando bem mais difícil de ver em qualquer versão, diga-se de passagem. Das quadradas mesmo já faz bastante tempo que eu não vejo uma sem estar muito detonada, mas antes até vi algumas GLS, inclusive uma com câmbio automático que era de um vizinho na época que eu morei na Trindade. Até não me causaria tanta surpresa se ele ainda tiver aquela Quantum, por causa de um problema que ele tem numa perna.

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  2. Acho que as Quantum mais luxuosas teriam sobrevivido melhor no mercado. Lembre-se que em 1985, mesmo os Dodge Lebaron e Magnum mais conservados eram carros velhos que era frequentemente adquiridos por uma quantia de Cr$ 5,000,000 - em palavras modernas, só mais uma lata velha de 5 ou 10 mil reais.

    A Quantum tinha vantagem de ter quatro portas e motor mais econômico em relação aos 2.5 e 4.1 litros da Chevrolet. Na questão peso-potência, mais ponto positivo para a Volkswagen. Se a Chevrolet conseguiu sair bem com 3000 unidades das Caravan Diplomata, a Volks conseguiria tirar, no mínimo, o dobro ou triplo disso. Talvez enxugando a linha de veículos, pois manter o Beetle em produção era um problema para a linha Volkswagen. Reposicionar o produto também é uma estratégia a longo prazo, que funciona muito bem. O Fusca já era pra ter sido eliminado em 1980 com a chegada do Gol, mas o erro de continuarem usando o mesmo motor para dois carros, certamente minou os sonhos altos da diretoria da Volks.

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    1. Tenho a impressão que o perfil do público de wagons na época ter sido menos "formal" que o de quem comprava o sedan de uma mesma linha deixasse a diretoria da Volkswagen mais cética. Wagons no geral ainda eram vistas como utilitários, e usos como ambulância e carro fúnebre reforçavam essa idéia.

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    2. Até faz sentido que o mundo globalizado de hoje prefira os SUV; a grande maioria dos automóveis antes de 1914 eram basicamente carruagens enormes e pouco refinadas para serem consideradas automóveis práticos. A venda de compactos antes da guerra mundial minguava pra caramba, mesmo na Europa onde a geografia não permitia veículos enormes. Os asiáticos sempre escolhiam vans e minivans por questões geográficas também.

      Wagons continuam reinando tranquilamente na Europa. Na América, elas só caíram em desuso porque o conforto absurdo do primeiro mundo sempre permitiu um estadense ou canadense escolher entre uma Wagon ou uma Pickup. O "renascimento" do SUV se deu com essa necessidade de unir uma Wagon e uma Pickup; nos USA já havia passado a grande festa dos enormes sedans e coupes nos 1960s, a febre das Vans na década de 1970 e das Minivans nos anos 1980.

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    3. O que favoreceu a ascensão de SUVs em detrimento das wagons é serem homologados como "caminhão leve", e ao menos uma parte do valor pode ser deduzida do imposto de renda.

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    4. Exato. Em 1980, quando o Gol foi lançado com motor 1.3 a ar, a Volkswagen deveria tirar o Fusca de linha, mantendo a Brasília como uma alternativa mais barata ao Gol.

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  3. Pena que a Quantum CD não foi disponibilizada aos consumidores nas concessionárias. Mas a situação melhorou a partir de 1987, quando a perua passou a dispor da versão mais luxuosa, agora denominada GLS, tirando o privilégio que o Santana teve desde o lançamento, em 1984, até 1986. Se a GM deu a versão Diplomata para a sua Caravan, acabando com o privilégio do Opala, a Volkswagen poderia dar a versão CD para a Quantum.

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