sábado, 30 de janeiro de 2021

303,157 km/h: já viu um Opala (comprovadamente) correr tanto?

Esse negócio de recorde de velocidade é sempre interessante, mas é coisa antiga. A competitividade inerente ao ser humano faz com que essas disputas do "mais e melhor" sejam muito mais frequentes do que se imagina, às vezes até nos semáforos nesse mundão de Deus, quase sempre ilegais, desastrosas e sempre perigosas.

Mas a ideia de superar uma marca oficial de velocidade é algo muito empolgante - e foi justamente este desafio que o piloto Fábio Sotto Mayor - participante da Stock Car entre os anos de 1981 até 1999 e que alcançou 14 vitórias e o campeonato de 1988 - aceitou quebrar no já distante ano de 1991 a bordo de seu incrementado Opala. O recorde foi quebrado, mas não foi lá muito fácil, como podemos ver - e ler  - do relato de Cláudio Carsughi para a revista Oficina Mecânica (edição n. 64):





Anos mais tarde o piloto Cacá Bueno alcançou 345,9 Km/h no deserto americano de Boneville com um Stock Car mais atual; porém, o recorde de velocidade em rodovia nacional continua até hoje com Sotto Mayor e seu Opala. Ao menos até alguém aceitar esse desafio e ir mais além, pois quebrar recordes é algo bastante tentador...

sábado, 23 de janeiro de 2021

Impressões ao dirigir: Toyota Bandeirante OJ50LV (Motor-3, março de 1981)

Se há uma coisa que vai durar muito mais do que durarei neste mundo é um Toyota Bandeirante. Utilitário dos mais parrudos, os Bandeirantes eram muito bem feitos sobre base muito sólida - diria até agressiva - com mais de tonelada de aço, parafusos expostos e uma força bastante apreciável, fruto da tração múltipla acoplada a uma sólida caixa de redução e, nos modelos mais "clássicos", oriunda do motor Mercedes-Benz OM-314 de 94 hp e durabilidade indefinida (especialmente se bem cuidado).

Lembro de ter andado em uma picape de cabina simples, bege (como muitos carros eram pintados nos anos 1980) e bastante suja, era de uso em uma marmoraria. O bicho é nem um pouco confortável, a trepidação do motor encaminhada à carroçaria poderia ser medida pela Escala de Richter e o conforto se reduzia às janelas de ar abertas em um dia quente e o banco inteiriço de molas saltitantes revestido com um robusto e empoeirado couvin preto. Mas a bordo daquele utilitário, tive a impressão de que poderia vencer qualquer obstáculo. E ir para qualquer lugar desse mundo.

Modéstia à parte, foram quase todas as impressões que Paulo Celso Facin teve ao dar uma volta com uma nova OJ50LV. Digo quase porque apenas ele e a turma da Motor-3 teriam esse dom de relatar seus testes, além do fato de o nosso querido PCF ter se deparado com um atoleiro que mais parecia uma armadilha feita de cola epóxi:







Forçando um pouco mais a memória, recordo que um sujeito que morava no meu bairro - pai de uma colega minha do colégio, a Laura - tinha um Toyota da mesma época, só que vermelho e acrescido de um snorkel (uma espécie de prolongamento do tubo de escapamento até uma parte mais alta do carro para evitar a ingestão de água pelo motor) e as lanternas traseiras de caminhão Mercedes-Benz na época. Estou certo de que a família da menina trepidava bastante nas lajotas que calçavam o meu bairro, mas eles poderiam ir a qualquer lugar desse mundo.

sábado, 16 de janeiro de 2021

Linha Chrysler 1974

As atenções da Chrysler do Brasil estiveram voltadas no ano de 1973 ao seu caçula (em idade e em tamanho), o Dodge 1800. É uma história que já contamos aqui várias vezes, mas não canso de repetir: o Doginho nasceu com uma série de doenças infantis, maior parte delas devida ao lançamento prematuro, circunstância que, aliada ao pobre controle de qualidade, irritou muita gente que comprou o carro. Apesar de tudo, era um projeto promissor - apenas de "mal nascido" - e a fábrica do pentastar precisou se mexer rapidamente para resolver as coisas.

No ano de 1974, segundo ano de produção, o Dodge 1800 recebeu mais atenção (sobretudo na manufatura e no controle de qualidade) e um carburador inglês da afamada empresa SU - de Skinner Union (Herbert Skinner e o seu primeiro carburador, modelo Union, daí a sigla SU), melhorias que resultaram na melhor potência, performance, consumo e qualidade geral, conforme podemos ver da avaliação assinada pelo saudoso Expedito Marazzi e ilustrada por Paulo Lorgus para a edição n. 159 da Quatro Rodas:






Marazzi se queixou dos pulos que o Dodge 1800 desempenhava nas freadas mais fortes (cuja responsabilidade atribuiu ao eixo traseiro) e das falhas no acabamento (apesar de melhorado); porém  o inesquecível redator pôde antever que o simpático Doginho era bastante promissor. A Revista Auto Esporte, em sua edição de outubro de 1973 - sem, infelizmente dar crédito ao redator e ao fotógrafo - fez uma rápida avaliação do modelo 1800 e elogiou as melhorias, embora criticasse uma falha no sistema de freios, provavelmente uma falta de atenção na revisão antes do teste:



Com tanta novidade e esforço ao modelo menor, a Chrysler não teve lá muito tempo para pensar em algo mais elaborado para os filhos maiores (bem maiores, aliás). Mas isso não significa que eles não receberam presentes de natal, à exemplo do Charger R/T, esportivo agraciado com ignição eletrônica (coisa que a Simca já usava nos anos 60, mas ainda era um bocado rara) e um novo esquema de faixas, além de novas cores:


Ah, se pudesse eu teria um Charger R/T verde córdoba (código de plaqueta G9) com interior bege, com um possante ar-condicionado sempre ligado e gelado, pronto para fugir do congestionado litoral e encarar as serras de Santa Catarina, com torque de sobra para subir paredes e fazer curvas de um jeito bastante divertido...

sábado, 9 de janeiro de 2021

Volkswagen SP-2: novidade em dois testes (1972)

Se há um carro que me impressionou na primeira vista, bem, foi o VW SP-2. Só o conhecia por fotos e pela descrição dos amigos, mas, pessoalmente, fui vê-lo em 2009 em uma exposição. Um veículo tremendamente baixo para o meu metro e oitenta e sete de altura, mas, ao me abaixar, vi um interior soberbo para os anos 70, luxo em detalhes e funcionalidade que (desculpem os que gostam) um Puma da época não alcançou.

Tracionado por um engenho boxer de exatos 1.678 cm³ de cilindrada - capaz de render 75hp em 5.000 rotações por minuto e um torque de 13kgfm quando a agulha do contagiros chega à marca de 3.500 rpm - o SP-2 andava muito bem e chamava atenção adoidado, certamente o carro mais vistoso jamais lançado pela Volkswagen nacional. E tal novidade não passou em branco pelas publicações da época, tal como a Quatro Rodas, em avaliação assinada por Mathias Pettrich e com imagens de Fernando Abrunhosa para a edição n. 144:




Interessante notar que a revista avaliou uma unidade cedida pelo famoso concessionário Dacon e a maior crítica foi em relação ao desempenho: apesar de todas as qualidades e o veneno extra preparado pela Volkswagen, a mecânica robusta não apresentava um nível de potência compatível com as expectativas criadas pelas linhas e o acabamento muito especiais. 

Em contraponto, a avaliação da revista Auto Esporte - com avaliação feita por Jean Balder e Heitor Feitosa e ilustrada por Cláudio Larangeira para a edição de agosto de 1972 - classificava o desempenho dinâmico como "suficiente", além de ressaltar as inúmeras qualidades do carro, com ênfase no interessante trabalho da fábrica para ampliar a cilindrada do boxer 1.600:





O número de vendas do SP-2 (e mais ainda o de sua versão mais simples, SP-1) não reflete nem um pouco as inúmeras virtudes do carro e do que ele significou na época. Talvez o tão desejado SP-3 - com motor Passat, divertida traquinagem montada pela Dacon - pudesse melhorar um pouco as coisas no quesito vendagem se acaso fosse produzido em série pela VWB; mesmo assim, o sofisticado esportivo tem lugar cativo na história do automóvel. E cá pra nós, deve ser muito interessante guiar um carro tão baixo, quase colado ao chão, em uma estrada deserta e cheia de curvas numa adorável manhã de primavera...

sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Um Dodge V-8 para curtir com a turma: Marcopolo Veneza Dodge D-900 (1977)

A Chrysler do Brasil, apesar das dificuldades financeiras, sempre se revelou uma empresa das mais inventivas: um bom exemplo se traduz na pesquisa do uso do álcool hidratado como combustível para seus motores, isso na alvorada do Programa Nacional do Álcool - Proálcool, iniciativa deflagrada pelo então governo Federal por meio do Decreto n. 76.593, de 14-11-1975.

Naquele mesmo ano a fábrica do pentastar - com o apoio técnico coordenado pelo Centro Técnico Aeroespacial - CTA, à época sob a responsabilidade de Urbano Ernesto Stumpf - fez os ajustes necessários ao uso da novidade no motor 4 cilindros do Dodge 1800. E em companhia de um Volkswagen 1300 e de um Gurgel (outros companheiros da iniciativa pioneira), um exemplar do Doginho percorreu no final de 1976 mais de 8.000km em um teste denominado "I Circuito de Integração Nacional":

Apesar das prováveis dificuldades com o maior poder corrosível do álcool, o Dodge 1800 saiu-se bem na prova de mais de 8.000km. Atrás dele, um Gurgel Xavante que também participou do teste.


Ainda bem que esse interessante Dodge 1800 sobreviveu para nos contar a história! (Imagens extraídas do excelente: http://antigosverdeamarelo.blogspot.com/)

Interessante que nos registros oficiais (consultados via Sinesp) o Dodge aparece como modelo 1977: o mais plausível é que o Dodge 1800 de chassi n. 47.450 seja um pré-série fabricado em 1976 modelo 1977, especialmente porque a cor azul não consta da paleta de cores oficial da fábrica naqueles dois anos modelo!

Os resultados dos estudos capitaneados pela fábrica - cuja responsabilidade recaiu sobre a equipe do engenheiro Clóvis Michelin - também apareceram apareceram na edição de 08/1976 da revista Quatro Rodas:

Notem que o motor desse interessante Dodge 1800 1975 Gran Luxo branco valência ainda usava o interessante carburador SU

Flávio Vincenzetto não teve autorização do CTA para aferir o desempenho dinâmico (inclusive consumo) do Doginho, mas constatou que a dirigibilidade parecia não estar comprometida com o uso do álcool.

E além do propulsor menor, a Chrysler do Brasil também trabalhou na adaptação do seu V8 ao novo combustível vegetal, conforme vemos estas imagens destes exemplares de 1981, todas localizadas por meio do buscador do Google:

Um interessante Dodge Dart sedã a plena carga para testes com o combustível vegetal

Este Polara GL certamente já lidava bem com o álcool, até porque esta nova tecnologia já estava nas ruas há dois anos pelas mãos da Fiat e da Volkswagen

Pena que a Chrysler - inclusive a matriz americana - atravessavam tempos muito difíceis e a fabricante deixou de produzir seus Polara e Dart em 1981 sem lançar uma versão etílica, uma triste injustiça com esta pioneira que somente se explica pela falta de recursos... Mas ao menos o confiável V-8 foi aproveitado pela Volkswagen Caminhões em alguns dos modelos de caminhão Dodge (além dos novos cargueiros com seu nome), à exemplo deste interessante E-21, lançado em setembro daquele ano:


Note que a potência com o uso de etanol era até bastante apreciável; contudo, o consumo em solicitações extremas poderia ser mensurado em centenas de metros por litro, daí porque o uso de tais cargueiros ficou restrito à indústria sucroalcooleira (catálogo publicado no saudoso site Caminhão Antigo Brasil)

E se a Chrysler do Brasil trabalhou entre os anos de 1975 até 1981 na utilização do combustível derivado da cana-de-açúcar para mover automóveis de passeio e veículos de carga, houve, também, a inédita inciativa de criar um chassi para ônibus com o conhecido pentastar.

Ah, antes que você me pergunte, sabemos que até os anos 70 era relativamente comum ver um ônibus montado sobre um chassis de caminhão, aproveitando-se, para isto, da frente do veículo (cabine sem portas e teto, às vezes até sem a moldura do parabrisas original), como este Dodge D-700 encarroçado pela Caio no modelo Gabriela Andino:

Imagem publicada por Paulo Roberto de Morais Amorim no site Ônibus Brasil

Marcopolo também encarroçou alguns Dodge, à exemplo deste modelo Sanremo ST, praticamente fabricado para o mercado externo, sobretudo latino-americano: 


Imagens localizadas por meio do buscador do Google: avise-me se for o primeiro a disponibilizá-la para divulgar aqui os devidos créditos!

Sabe-se que a fábrica cogitou em 1976 a sua entrada no concorrido mercado de chassis de ônibus, mas, em maio do ano seguinte, a ideia de usar os chassis do D-400, D-700, D-900 e D-950 foi abandonada. Não sem antes pensar em uma solução que parecia promissora: o uso de um chassis para ônibus urbano movido a álcool!

Naquele período, o pessoal da engenharia da Chrysler preparou a plataforma do modelo de caminhão D-900 equipada com um pioneiro V-8 318 alcoolizado e o enviou a cidade de Caxias do Sul/RS para a Marcopolo montar sua carroceria urbana então em produção, o modelo Veneza, cujo resultado podemos ver abaixo:

Imagem publicada por Gilberto Martins no site Ônibus Brasil

Notem que o simpático Veneza era relativamente curto para um coletivo usualmente aplicado no transporte coletivo de passageiros (mas, de todo modo, parece ser maior do que os 5,00m da medida de entre eixos mais longa disponível no catálogo do D-900 e D-950) e em razão do eixo dianteiro avançado, a solução foi aplicar a porta dianteira atrás dele, solução aplicada à época nos chassis Mercedes-Benz LP-1113 e Scania no modelo B-110:

Notem que o veículo experimental foi até mesmo equipado com o posto para cobrador, instalado à direita da porta traseira (imagem do acervo de Jozoilton Souza Lopes publicada no site Ônibus Brasil)

Notem a grade auxiliar para auxiliar o arrefecimento do interessante V-8 que morava na dianteira desse chassis D-900 (imagem localizada no buscador do Google)

O coletivo recebeu as chapas NQ-2610 de São Bernardo do Campo/SP e possivelmente foi utilizado no transporte de funcionários e até mesmo como "mula" para a continuação do desenvolvimento do motor 318 movido a álcool. Mas isso são apenas conjecturas, pois não encontrei referências sobre a vida útil desse interessante Marcopolo/Dodge, especialmente a respeito do que aconteceu após a absorção da fábrica pela Volkswagenwerk. Tampouco sei se outro ônibus assim foi montado...

Porém, há uma remota possibilidade de este modelo (ou de outro idêntico?) ainda existir, pois em 2012 este ônibus transformado em motorhome foi fotografado por Breno Jhonatan na cidade de São Gotardo/MG:

Imagem de Breno Jonathan publicada no site Ônibus Brasil

Digo que há uma remota possibilidade de o Veneza retratado mais recentemente ser o protótipo da Chrysler porque: a) não há notícia de outro chassi Dodge D-900 ter sido encarroçado pela Marcopolo (ou qualquer outra empresa do ramo); b) as dimensões retratadas nas fotos são bastante semelhantes (note que o número de janelas - contando as suprimidas - é o mesmo daquelas constantes no Veneza Chrysler); e, c) o emblema da Mercedes-Benz pode indicar a aplicação de um motor diesel da marca germânica, mas as informações do Sinesp dão conta de que este veículo é um legítimo D-900 fabricado em 1977:


Interessante é que as iniciais da chapa são referentes à sequência que foi atribuída em 1991 pelo Denatran ao estado de São Paulo, circunstância que reforça a origem paulista deste Marcopolo Veneza com chassi Dodge. Vai que esse coletivo ao sair da fábrica - se realmente o ônibus CKP-7037 for o nosso protótipo - permaneceu em São Paulo até ser transformado em motor casa? São conjecturas, apenas...

As lanternas traseiras não são mais originais e o teto foi ampliado para o seu uso como lazer. E o veículo estava em muito bom estado! (Imagem de Breno Jonathan publicada no site Ônibus Brasil)

Talvez nunca teremos certeza de que esse Veneza motorhome antes foi o inédito D-900 movido a álcool; se for, certamente o pioneiro alcoolizado (hoje com motor diesel, ao que tudo indica) está divertindo seus novos proprietários nessas muitas estradas do Brasil...