sábado, 18 de outubro de 2025

Rápidas linhas sobre a Ford F-2000 (1980-1985)

Imagine que você precisa distribuir os produtos de sua empresa numa região central de uma cidade de grande porte. E para dificultar um pouco as coisas, o trânsito desse lugar não é dos mais fáceis e há restrição para veículos maiores (comprimento e peso por eixo); mesmo sem a proibição do tráfego de um cargueiro maior, não compensaria ter um caminhão com capacidade de 4t de carga, seria um desperdício para deslocar as 2t ao longo de um trajeto de 90km diários.

Opções, por certo, não faltariam, até mesmo elétricas. Mas aqui é um blog que teimosamente se dedica aos veículos antigos e por isso o exercício de imaginação vai mais aquém no tempo, mais precisamente para o ano de 1980. Sua empresa precisa transportar 2t de carga pela cidade, com entregas fracionadas em vários pontos, e como seu chefe sabe que você gosta e entende de veículos, pede soluções para resolver o problema.

E elas não eram tão fáceis. A Fiorino já existia, mas precisaria de ao menos quatro delas para levar toda a carga, nessas horas o chefe torceria o nariz, pois há o custo de operação de uma frota de picapinhas... Um Fiat 80 ou um Mercedes-Benz L-608 (o Volkswagen 6.80 demoraria um ano a mais pra ser lançado) eram superdimensionados e um tanto caros para aquele momento, seria uma grande imobilização de capital. Ah, você poderia indicar o Furgão Invel, mas o patrão faz cara feia ao lembrar da falta de agilidade da mecânica VW a ar em um veículo que leva mais de uma tonelada nas costas. A F-1000 levava apenas metade da carga, a D-10 a mesma coisa, e ao fim se decidiu por comprar duas Kombi para as entregas. Apesar de não ser exatamente o que seu chefe gostaria.

Bem, o exemplo não é real, mas o vácuo entre a F-1000 e a F-4000 existia; certamente por isso, a Ford trouxe um novo produto, a F-2000, basicamente uma versão de menor capacidade de carga do que F-4000 maior e com mais capacidade do que a picape, um meio-termo pensado em satisfazer o consumidor que, como no exemplo acima, precisa de algo mais do que uma F-1000 (e bem mais do que uma F-100 ou a já antiga F-75) e algo menos do que um F-4000, mantendo-se fiel à Ford.

E a novidade veio ao público em 1980, aparentemente o ano em que este catálogo, divulgado pela Anfavea, foi impresso para os potenciais clientes: notem as semelhanças com a F-4000, exceção feita ao eixo traseiro de rodado simples a justificar a menor capacidade de carga, além, é claro, das necessárias modificações nos sistemas de freio e assemelhados para atuar sob uma nova realidade:





A novidade era mesmo uma novidade, tanto que mereceu a capa de julho de 1980 da revista Transporte Moderno, cuja reportagem, cortesia do acervo digital da Editora OTM, vamos aqui mostrar:





O preço era até convidativo - a fábrica indicou que posicionaria o F-2000 em uma progressão de preços entre o menor F-1000 e o maior F-4000 - mas a reportagem indicava claros sinais de que a ideia, apesar de boa, não era exatamente o que o mercado pedia: o ideal mesmo seria um furgão mais compacto, sem perda de área de carga em razão do desenho da cabina, pois as se cargas eram até leves, a capacidade de deslocar máximo volume é essencial...

Mas como não se tinha outra opção - nada sequer parecido com os furgões integrais que rodavam no estrangeiro, úteis e muito difundidos - era adequado prever que a escalada de preços ajudaria muito na decisão de investir em uma opção na medida das necessidades e do quanto se precisava investir. Poderia dar certo, esperava-se que daria. Não foi o caso.

Acontece que a vantagem do menor curso inicial não perdurou muito: já em março de 1982 a Transporte Moderno, ao ouvir as impressões dos compradores da F-2000, recolheu críticas também em relação ao preço, pois a vantagem já não era mais tão atrativa assim:




Acontece que com o correr do tempo os preços passaram a ser aplicados de uma forma diferente, de modo a praticamente extinguir a vantagem do preço da F-2000. Para a gente ter uma noção, naquele mês de março de 1982 a diferença dela para a F-4000 era mínima, sem as vantagens intrínsecas de um veículo de quatro toneladas. Poderia até ser que o comprador não precisava de quatro toneladas de capacidade, mas não fazia tanto sentido economizar alguns cruzeiros para ter um veículo que poderia carregar mais carga, eventualmente, com mais liquidez no momento de revenda. Deixou de ser um bom negócio, portanto.

Não era por falta de qualidade ou por uma desvantagem de projeto, mas não posso deixar de dizer que melhor seria se a F-2000 viesse como um furgão integral, insisto. E a ideia seria a repetição de uma ideia antiga, pois lá em 1970 a Brasinca atendeu à encomenda de uma unidade fabricada sob a modificada base da F-75, mas a ideia não passou de um único protótipo:

Imagem da revista Manchete, via página do Museu do Automóvel Brasileiro - MAB, do Facebook (recomendo a visita!)


E é claro, não posso esquecer da Furgline, obra da Souza Ramos, que providenciou a instalação de uma carroçaria furgão para múltiplos usos (inclusive em um interessante ônibus), essa que não tinha um custo muito contido (até pela produção em menor série), mas mostrava claramente o potencial da plataforma F-2000 em um desenho mais compatível com as necessidades de quem transportava muito volume e nem tanto peso, tal como se pode ver do presente catálogo:



Tenho há anos essa cópia digital do arquivo, não lembro onde o obtive, então se você foi o responsável por divulgá-lo, por favor me avise para eu agradecer a disponibilidade e dar os devidos e necessários créditos.

A questão era o preço, infelizmente a F-2000, em termos financeiros, não compensava tanto. E não foi por falta de tentativa, pois a Ford não desistiu dela, tanto que frequentemente ela aparecia em anúncios da linha Ford, como este do ano de 1983:




A F-2000 viveu uma vida discreta, apesar de não ser um produto ruim: em seus cinco anos de produção, vendeu exatas 5.284 unidades (298 em 1985, último ano), ao passo que a F-4000 teve neste mesmo período 130.859 cópias (7.499 só em 1985), diferença das mais expressivas, como você pode supor.

Para se ter uma ideia, os Fiat 70 e 80, de uma faixa de mercado aproximada, alcançaram a produção total somada de 6.756 veículos. Ainda conforme a edição de março de 1986 da Transporte Moderno, fonte de tais dados, a F-2000 somente vendeu mais do que a Dodge 400 gasolina em seu seguimento, esta que teve apenas 4.732 produzidas (a versão D-400 diesel teve mais êxito com suas 9.634 fabricadas). Se a F-4000 foi um sucesso, a irmã menor passou longe disso...

O artigo aqui é dos mais breves, até porque não temos aqui a intenção da definitividade sobre quaisquer temas. Mas do que vimos até agora, a falta de sucesso da F-2000 em seus cinco anos de produção se deveu apenas por uma questão de custo-benefício. Pena, pois ela poderia ser promissora. E você, o que pensa a respeito?

sábado, 11 de outubro de 2025

Catálogo da semana: Linha Toyota Bandeirante (1973)

Se você precisar de um veículo confortável, daqueles que deslizam feito um tapete mágico numa pista de asfalto decentemente asfaltada, definitivamente o Bandeirante não será uma boa opção. Alguns deles, devo dizer, contavam com condicionador de ar (muito útil) e direção hidráulica (muito necessária), mas isso não os tornava um carrão executivo, daqueles em que a gente curte a vida ouvindo música suave numa bolha de conforto térmico e acústico quase esnobe.

Se você gosta de tecnologia, melhor procurar outro veículo: nenhuma tecnologia dele remonta a segunda metade do século XX, talvez os pneus radiais contem se você fizer questão deles. As linhas do utilitário não sofreram mudanças por longos anos e ele saiu de linha por não mais conseguir se manter dentro dos limites aceitáveis de poluentes (talvez não compensasse mais pra Toyota investir nele, sejamos francos).

Porém, se você quer um veículo que te leva para qualquer lugar possível de ir a bordo de um veículo - e digo isso sem exagero - o Bandeirante é uma ótima opção. A robustez dele é proverbial: o projeto do jipe se pautou pela vocação integral ao uso rude, em caminhos rudes e em tarefas rudes por longos e longos anos: sobrecargas não eram raras, então não duvide das histórias que se contam de que um Bandeirante conseguiu tirar um caminhão de um atoleiro sem se desintegrar... 

Já devo ter contado aqui (e eu sei que sou repetitivo), mas não esqueço de um passeio em que tive em uma picape: o bicho trepidava muito, urrava e pulava, tudo ao mesmo tempo em uma mistura de sensações que me fez lembrar de um brinquedo mais radical em um parque de diversões. Uma antítese do conforto que torna tudo mais divertido, até porque quando se vai num Bandeirante você se sente muito confiante de que vai chegar lá, seja lá aonde for esse lá...

A picape que andei era dos anos 90, mas hoje vou voltar vinte anos para recordar da linha 1973 dos utilitários: a rigor, nada de muito novo, a não ser os detalhes estéticos e o câmbio totalmente sincronizado (as das primeiras safras tinham as duas primeiras velocidades de engrenamento direto) surgiram paulatinamente. O catálogo, cortesia da Anfavea, merece nossa visita:







Um dos segredos do sucesso da linha Toyota tem nome e sobrenome: OM-314 Mercedes-Benz. Esse propulsor de quatro cilindros e 85cv de potência pode não ser hoje um exemplo de tecnologia, mas a durabilidade dele é das maiores. Basta cuidar da bomba injetora, dos lubrificantes e da qualidade do diesel, você tem um motor para a vida toda. E não há exagero nisso...

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Catálogo da semana: Volkswagen Santana (1992)

Costumo dizer que o meu carro favorito é aquele que está em minha garagem, mas, sinceramente, se pudesse a garagem aqui de casa seria bastante ampla e contaria com diversos carros diferentes, de épocas distintas e de marcas variadas. Dentre eles, por certo, estaria o Santana.

Tive oportunidade de guiar um modelo GLS 2000 quatro portas, gasolina e vermelho desbotado há uns anos atrás e gostei muito do conjunto, muito acertado e com torque suficiente para fazer um passeio bem agradável. Por diversas conjunturas, sobretudo financeiras, tive sempre automóveis com cilindrada menor do que gostaria e por isso foi (é e sempre será) um prazer sentir a tranquilidade do torque de um motor maior. Saber que há uma reserva de potência para os imprevistos, é um fator de muita serenidade...

Outra vivência, essa como passageiro e mais antiga, foi a bordo de uma Quantum GL 2000 álcool, andava maravilhosamente bem na BR-101 do tempo da pista simples, com ultrapassagens seguras e uma retomada que me fazia sentir num veículo muito interessante. O condicionador de ar impedia que o verão entrasse no caprichado habitáculo e o nível de ruído, de todo modo, era bastante aceitável. Nunca esqueci aquela Quantum 1992 e se pudesse, podem ter certeza, teria uma dessas para viagens longas e tranquilas pelas estradas desse imenso Brasil.

E é justamente do ano de 1992 o catálogo que temos a oportunidade de apresentar nesta semana: voltado às versões de quatro portas (e não podemos esquecer que o Santana também poderia ser comprado como um carro com duas portas a menos, em detrimento do conforto e em benefício de um desenho um tanto mais "esportivo"), esse belo folheto - cortesia da Anfavea, a quem sempre agradecemos -  revela em detalhes os níveis de acabamento para quem desejava ter um Santana em sua garagem:












Se por acaso pudesse voltar no tempo, encomendaria no concessionário local um Santana GL quatro portas, álcool, verde com interior bege e com ar condicionado e trio elétrico. Fecharia os olhos para o relógio demasiadamente grande no painel (contagiros só para versão GLS) e abriria um sorriso para as boas virtudes daquele carro, as quais, sabemos, garantiram uma longa vida ao Santana. 

sexta-feira, 20 de junho de 2025

Reportagem da Semana: Del Rey automático (1982)

A história do Del Rey é por demais conhecida, mas não custa recordar que a Ford, em 1981, teve a iniciativa de trazer um novo modelo para suprir a falta (tanto quanto possível) do Maverick no mercado nacional, descontinuado que foi em 1979. Não sei se é possível dizer que o Del Rey, uma versão surgida do Corcel, seria um substituto adequado ao Maverick, mas, por outro lado, era compreensível que as dificuldades e angústias que se prenunciavam nos anos 1980 fizeram com que a fabricante optasse por tal alternativa.

Explico: o Maverick era um carro maior, projeto americano do final dos anos 1960, com uma proposta muito adequada para aquela época, de dimensões maiores (o sedã, de entre-eixos ainda maior) e capaz de fazer frente ao Dart, ao Opala e ao Alfa 2300 em suas variadas opções de acabamento e mecânica, sem maiores preocupações com eficiência energética. O Del Rey, apesar de limitado à plataforma do Corcel, beneficiando-se de suas virtudes e seus defeitos, era bastante adequado em termos de consumo e com um acabamento muito esmerado, a ponto de ter itens que o Landau, topo de linha, jamais teve, como os vidros elétricos.

Talvez, digo talvez, o Sierra fosse um substituto muito melhor para o Maverick, mas, para cá, nunca veio, a não ser nas mãos dos turistas argentinos que passeavam por nossas estradas litorâneas. O que tivemos era o Del Rey,  um produto mais perto de um "compacto premium" do que um "médio". E não era um carro ruim, muito longe disso. Afinal, quem queria conforto, economia, tranquilidade na vida e na tocada, teria um excelente veículo em suas mãos. Não derreteria corações nas ruas da moda, mas era um carro bastante confiável para quem queria mais sossego na vida..

Acessórios, então, não faltavam: tinha até teto solar, ar condicionado de boa potência, suspensão calibrada para passeios macios, vidros e travas comandadas eletricamente, toca-fitas Philco de boa qualidade, acabamento muito esmerado, várias cores metálicas e tudo mais.. Entretanto, quem não fazia questão de acionar a embreagem e lidar com a transmissão de cinco velocidades, sentia falta de algo a mais, a transmissão automática.

E ela veio, no final de 1982, já como novidade para o modelo de 1983, não exatamente muito moderna, mas adequada para o uso pacífico que o Del Rey inspirava, cuja avaliação o nosso saudoso JLV fez para saudosa Motor-3, edição de 12/1982, cuja íntegra temos o prazer de mostrar:







Não se tratava de um carro perfeito (nada é), mas, resolvido o problema dos pedais, era um carro muito competente e adequado para o uso do dia a dia. Pode até ser que não tenha vendido muito, tampouco teria condições de substituir o Maverick (e nem se fale do Landau), mas era um carro interessantíssimo e muito bom de andar. E o motor, quando bem cuidado, durava uma eternidade...

sexta-feira, 11 de abril de 2025

Catálogo da Semana: F-4000 (1986)

O F-4000, lançado em 1975, era fruto de um período um tanto difícil para os veículos de carga com motor a gasolina: apesar de ser vantajoso em algumas operações, como o transporte de bebidas (o preço inicial menor do caminhão a gasolina era um atrativo em uso de baixas quilometragens), o diesel ganhou muita força depois das agitações no mercado do petróleo ocorridas um ano antes. Se o óleo diesel não era uma vantagem para todos, a gasolina subitamente pareceu ser cada vez menos atrativa...

Que o diga a Mercedes-Benz, fábrica que desde sempre apostou no diesel e desde 1972 contava com boas vendas em seu modelo menor L-608 (o mercedinho, apelido que não era nenhum demérito), caminhão leve e muito ágil que provou logo cedo suas qualidades para o mercado. E o pessoal da Ford logo deve ter percebido a necessidade de oferecer algo naquele seguimento de clientes, daí por que a crise de energia pode ter contribuído para acelerar a urgência em ter um concorrente à altura, tão bom quanto possível.

Assim, em 1975, a Ford lançou o F-4000, a versão diesel do F-350 V8 de então: com o excelente motor MWM 229-4 de 98cv acoplado a uma transmissão de quatro velocidades, o peso bruto total chegava a boa marca de 6t, nada mal para época. E quando digo que foi nada mal, também me refiro às vendas: o F-4000 fez história e foi produzido até o crepúsculo da Ford Caminhões, épocas em que tinha até versão com tração integral, sem falar na F-2000, esta de vida muito breve (e que merece uma postagem aqui, podem me cobrar) e não obteve uma fração do que a irmã mais robusta teve ao longo dos anos.

Por falar em anos, o catálogo dessa semana é do modelo de 1986, ano em que ganhou nova grade e para-choque, disponibilizado pela Anfavea (cuja gentileza deve sempre ser agradecida). Notem a interessante pintura bicolor opcional, os estofamentos com desenho caprichado e as duas opções de motor: além do propulsor MWM, um engenho da casa (hoje até um tanto incomum de se ver):



O fim das atividades da Ford Caminhões não significou o fim dos cargueiros da marca: não é raro ver um F-4000 rodando nas mais diversas tarefas, desde transporte de mudanças até como motor home. Não sei se a Ford tinha essa noção há cinquenta anos atrás, mas, devo dizer, ao lançarem o F-4000 eles ajudaram a escrever a história.

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Catálogo da Semana: Fiat Furgoneta (1985)

Quando se pensa nos utilitários Fiat, a primeira lembrança que geralmente nos ocorre é a Fiorino, variação do Fiat 147 muito bem sucedida lançada em 1978, já modelo 1979, sucesso de público incontestável até hoje. Afinal, a Fiorino em suas variações com caçamba e baú fechado (esta ainda em produção) foi uma precursora neste mercado de pequenos veículos dedicados ao trabalho.

Se há um mérito na Fiat (e sei que ela tem vários) é o de ter agilidade e ousadia em seus lançamentos: sem querer entrar na eterna polêmica dos entusiastas a respeito da incomum rapidez em que o Uno Mille foi lançado (muito pouco tempo após a alteração na legislação que previa menores tributos para motores com cilindrada diminuta), posso dizer, com tranquilidade, que a Fiorino basicamente inaugurou o seguimento de picapes derivadas de veículos leves no Brasil, algo que as concorrentes demoraram alguns anos pra igualar: a Pampa e a Saveiro só nasceram em 1982, a Chevy 500 dois anos mais.

Mas hoje não quero elogiar a Fiorino (que ainda existe, mas dos tempos pioneiros só guarda a semelhança com o nome), mas sim lembrar da primeira variação do Fiat 147: a Furgoneta. Sim, a Furgoneta, lançada em 1977, já como modelo 1978, foi o primeiro utilitário da marca no Brasil.

Imagino que não foi muito difícil projetar esta versão, que não tinha os vidros laterais e traseiro (substituídos por chapa metálica) e o banco traseiro, de forma a dar lugar à carga que um pequeno veículo como o Fiat 147 poderia carregar: não ganhava campeonato de força, mas o espaço interno era muito bom, mérito do motor e tração dianteiros e um desenho anguloso reto da carroçaria, na medida para abrigar o que fosse preciso no compartimento traseiro.

Além disso, a Furgoneta tinha um trunfo fantástico: ela já nasceu com o motor 1300 movido a álcool (e como ano/modelo 1978 só foi vendida com motor etílico), o que a tornou desde cedo elegível para frotas públicas e frotistas interessados na alternativa energética tão nacional. Particularmente em Santa Catarina, ente federativo que melhor conheço pela minha íntima convivência desde o nascimento, a Furgoneta (sim, no feminino) serviu à Polícia (os presos iam atrás, claro) e carro de apoio às empresas de capital público, especialmente a Telesc, do ramo de telefonia. 

Mas esse sucesso inicial foi obscurecido pela Fiorino, certamente uma opção melhor para levar carga, sobretudo pelo baú muito mais amplo: basta lembrar que nesses muitos anos de vivência automotiva, não vi Furgoneta em mãos civis ou militares. Uno Furgão, sim, vários até, mas Furgoneta... E para lembrar desse interessante carro que jamais tive a oportunidade de ver ao vivo, e que nem todos devem se lembrar, disponibilizo hoje o catálogo da versão lançada para o ano de 1985, material digitalizado e graciosamente divulgado pela Anfavea, em iniciativa a merecer aplauso:



E há uma razão lógica e plausível para eu nunca ter visto uma Furgoneta na lida: o Livro "Fiat 147", de Rogério de Simone e Rogério Ferraresi (Editora Alaúde, 2016, recomendo a leitura!), divulga dados de produção da Anfavea e no ano de 1985 a Fiat produziu 1.191 furgões com motor 1300 álcool e outras 65 com motor 1050 gasolina. Vai daí que ninguém ficaria surpreso ao saber que o último ano de produção foi 1987, com apenas 35 cópias com motor etílico, nenhuma a gasolina... Então, temos aqui um carro muito raro e até esquecido, mas com imenso valor histórico.

sexta-feira, 28 de março de 2025

Catálogo da Semana: Linha Chevette 1987

Depois de um longo inverno (involuntário, devo dizer), volto ao espaço para a gente continuar a prosear sobre os automotores, especialmente um sempre aparece em nossa pauta: o Chevette.

É que um dos nossos leitores está a restaurar um sedã de 1987 e precisa de referência a respeito dos tecidos dos bancos e a forração das portas e nada melhor do que a gente consultar o material da própria fábrica, no caso um catálogo muito interessante formulado pela Chevrolet para aquele ano modelo, este que foi gentilmente disponibilizado na íntegra pela Anfavea e que me apresso em mostrar pra vocês:


Nós já falamos do Chevette SE em uma outra postagem, mas é uma história que não custa reforçar: naqueles tempos de fortíssima crise financeira, o aumento dos preços dos veículos dependia de prévia autorização estatal, pedida com alguma antecedência e com fortes justificativas. Então, as fábricas (não só a Chevrolet) faziam modificações nas linhas, criavam novas versões e pequenos aperfeiçoamentos de modo a justificar um aumento.

É o caso da versão SE: mais luxuosa, com acabamento um pouco mais refinado, trouxe o luxo, calotas plásticas integrais (raras na época, hoje ainda mais) e alguns refinamentos cosméticos. Pena que o motor 1,6/S, com retrabalho para dar maior potência sem aumento sensível no consumo, ficou para o ano posterior: afinal de contas, não convinha lançar todas as novidades de uma só vez...





Notem a rara versão Hatch com o padrão mais alto de acabamento: você não via um desses com muita frequência, o mesmo se pode dizer da transmissão automática e do ar condicionado (não integrado ao painel) opcionais. E há uma explicação: um Chevette SE com todas as opções do catálogo custava até mais (ou quase a mesma coisa) do que um Monza SL/E básico, carro maior e com mais status. Vai daí que a gente vê muitos Monza com quase nenhum opcional e poucos Chevette com todas as opções...






A versão SL já nos é mais comum: era o mais básico, mas não fazia feio (apesar de o encosto de cabeça ser opcional - notem o raríssimo SL de interior marrom sem o equipamento de segurança). O estilo deste nível de acabamento é mais sóbrio (o que não me desagrada), além de poder receber opções para tornar as coisas mais amenas, como o já citado ar-condicionado (quem mora no litoral, como é meu caso, tem uma enorme simpatia pelo condicionamento do ar), pintura metálica, retrovisor do lado direito (faz falta) e outros detalhes. 



O catálogo não indica, mas faço questão de dizer as cores que estavam disponíveis para a linha Chevette para o ano de 1987: as sólidas (não metálicas) eram preto formal, branco Everest, vermelho bonanza, amarelo trigo e bege Itapema; as metálicas preto granito, azul platina, azul Búzios, dourado Itapuã, verde tropical, marrom canela e prata andino. E os revestimentos poderiam ser grafite, tabaco e preto, este último exclusividade dos modelos SE. 

São informações que recolhi há muitos anos em um surrado caderno de anotações de uma tabela da época que alguém me mostrou; pode até ser que as opções (sobretudo a incomum de a versão SL não ter a opção de revestimentos pretos, geralmente a mais comum) se alteraram no correr da produção, sobretudo em relação à adoção de cores que a fábrica normalmente não dispunha para os Chevette. Mas esses dados já são um norte pra gente ter em mente quando for ver um Chevette 1987.


Se pudesse (e como eu queria ter essa opção de volta no tempo...), encomendaria um Chevette SL com quatro portas, interior tabaco, dourado Itapoã e com ar condicionado: para o dia-a-dia, teria um carro confiável, confortável e estiloso para todos os momentos. E você?

domingo, 28 de abril de 2024

Catálogo da semana: Alfasud 1980

Se você costuma ler revistas antigas sobre automóveis, particularmente as do começo da década de 1970, certamente deve ter esbarrado em alguma edição que antecipava a possibilidade de a Alfa Romeo, que até então fabricava o veterano 2000 (ex-JK), teria um novo sedã grande em seu portfólio, depois chamado de 2300 e vendido entre os anos de 1974 até 1986, já sob a tutela da Fiat Automóveis.

Mas na época também se aguardava um outro veículo, o Alfasud. Lançado em 1971 na Itália (e que foi o primeiro produto da nova fábrica da marca, em Pomigliano d'Arco, no sul do pais, daí o nome Alfa + Sud), o carro era bem moderno: motor boxer arrefecido por líquido, boa aerodinâmica, freios a disco dianteiros próximos ao motor (in board mesmo, como em vários Citroën), este, no lançamento, com cilindrada de 1,186cm³ e potência adequada para seu uso mais citadino.

Depois a coisa melhorou com a versão Ti com um pouco mais de capacidade volumétrica e 68cv; em 1978 já se tinha o motor 1,5l de 85cv e as coisas até que iam bem. Tanto que dois anos depois o carro recebeu o seu primeiro redesenho, como mostra este catálogo interessante disponível no interessante site Love To Acelerate:






Três anos depois, em 1983, as versões de duas portas foram substituídas pelo Alfa 33, esta uma natural evolução do carro para melhor agradar ao mercado e reduzir alguns custos; o Alfasud tinha a péssima mania de enferrujar e outros pequenos problemas, mas fracasso não foi: vendeu algo perto de 890.000 unidades e certamente fez muita gente feliz pelo mundo.

Mas não aqui: o projeto Alfasud não saiu da cogitação ou de testes mais preliminares. Respostas para a morte antes do nascimento não são tão difíceis de se estimar: a nossa Alfa Romeo não era lá uma empresa com alta rentabilidade e os custos para fazer o pequeno Alfa aqui seriam astronômicos. A mecânica era diferente da que equipava o 2000/2300 e só isso exigiria extensa inversão de capital, além de todo o projeto de adaptação e tudo mais. Acredito que alguém fez as contas e percebeu facilmente que não valeria a pena.

Temos de lembrar que as fábricas de automóveis gostam de dinheiro, e não há nada de errado nisso. E elas também precisam gastar muito para receber o tanto de retorno que esperam (e é um risco); lançar um Alfasud seria muito, muito mais dispendioso do que o Alfa 2300, este uma evolução natural do cansado FNM 2150 e com muitas coisas aproveitáveis (lembra da questão do custo?). O pequeno Alfa seria um carro novo de ponta a ponta e isso implicaria em investimentos talvez mais altos do que a fábrica poderia bancar (e arriscar) e o mercado poderia absorver. Compreensível, portanto, que o projeto não tenha vingado, apesar dos ótimos predicados.

Pena, pena mesmo. Dos nossos "quase nacionais" que não saíram da cogitação, o Alfasud seria um dos mais legais; agora só pela burocrática via da importação para ter um em casa.