sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Mercedes-Benz 300 SL 1955

Coleciono revistas de automóveis desde os nove anos, época em que ganhei a minha primeira revista. Até aquele dia, reconheço, nem imaginava que alguém escreveria sobre automóveis. Tampouco pensava que alguém dedicaria uma revista inteira a eles... Enfim, são pensamentos de um rapaz que sequer tinha vivido uma década inteira, acostumado a ler apenas os livros didáticos e os HQ's que eventualmente apareciam na frente dos olhos.

Mas o tempo passou rápido, treze anos pra ser exato, e já tive oportunidade de ler muitas revistas, inclusive algumas de outros países. E não encontrei um teste tão belo quanto este, de José Luiz Vieira, publicado na revista Motor-3, edição 80 (02/1987).

Não é preciso falar muito sobre o JLV, tampouco a respeito da revista. Os leitores da saudosa Motor-3 sabem de quem estou falando: ela foi, de longe, muito longe, a melhor publicação do gênero já realizada no Brasil. E não soaria pretensioso dizer que foi uma das melhores do mundo. Aliás, o JLV é um dos maiores nomes do jornalismo automotivo nacional.

E para provar tais afirmações, disponibilizo aos caros leitores (e leitoras) deste espaço, o teste (ou uma aula de como escrever um teste de automóveis, como queiram) da Mercedes-Benz 300SL 1955, a superlativa Mercedes asa-de-gaivota 1955. Aproveitem!
 
Fonte: Revista Motor-3, edição nº 80, de fevereiro de 1987.
Esta postagem é uma pequena homenagem deste blog a extinta revista Motor-3 e todos os seus colaboradores. E fica o meu apelo: volta, Motor-3!

domingo, 20 de outubro de 2013

Sonhos Enferrujam

Hoje é dia de trazer um interessante documentário sobre a trajetória da Gurgel Veículos, assim como do seu fundador, João Augusto Conrado do Amaral Gurgel.

Falecido em 2009, Gurgel foi um brilhante engenheiro que criou, entre muitos outros projetos, o BR-800 - o primeiro veículo totalmente nacional. De personalidade forte, sempre adotou uma postura bastante independente no mercado nacional. Em 1974 ele já pensava em um veículo elétrico. E foi o único fabricante de veículos a se opor ao Próalcool.

Gurgel foi um homem notável. Merece o nosso respeito. E é por isto que um documentário como este, muito bem realizado, merece ser visto.

Com vocês, "Sonhos Enferrujam - Gurgel e o Carro do Brasil", documentário produzido em 2004:





Ficha técnica:

ECA/USP
Direção: Caio Cavechini
Roteiro e pesquisa: Evelyn Uliam, Liuca Yonaha, Letícia Sorg e Lilian Ronchi
Fotografia e trilha sonora: Gustavo Martins

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

História do Chevette (1981)

E volto à questão da precisão das datas: pra ser bem sincero com o amável leitor (a) deste modesto espaço, a maior novidade em termos de carroçaria foi lançada no final de 1980. Em setembro daquele ano a perua Chevette já estava nas ruas. Como é hábito, a Marajó já nasceu como modelo do ano seguinte.

O mote publicitário entrega: a Chevrolet vendia a Marajó como a forma mais aperfeiçoada do Chevette até então.
(foto: propagandasdecarro.com)
À parte com a questão das datas, vamos à Marajó. Sim, ela mesma, a Marajó, a station-wagon da linha Chevette. No exterior você a encontraria com outro nome: Kadett Caravan. Como já mencionei em outra oportunidade, o Chevette é o Kadett europeu e a Chevrolet do Brasil teve de adotar um novo nome para vender a perua por aqui, pois desde 1974 já tínhamos a Caravan, a station do Opala.
 
 

 
Do outro lado do Atlântico já existia a nossa Marajó, lá chamada de Kadett Caravan. Reparem que a nossa perua chegou um tanto quanto atrasada, pois ela já existia antes mesmo do lançamento da nossa (fotos: coches.com/stanceworks.com)
Se alguém se arriscar a chamar a nossa Marajó de Caravanzinha, penso que não será uma ofensa: em termos gerais, as duas peruas seguem a mesma cartilha: dois volumes, motor dianteiro e a tração traseira. E por falar em desenho, se um sujeito muito desavisado olhasse a Marajó de frente, da mesma forma em que se deu com o Hatch em seu lançamento, talvez ele não percebesse a diferença entre os outros modelos e a perua. Mas quem conseguia vê-la lateralmente, ah, seria impossível não ver a diferença.

É bem verdade que a Caravan e a Marajó estavam em "faixas de mercado" diferentes, mas, também é verdade que elas tinham muita coisa em comum além de terem nascido no mesmo berço. (foto: reumatismocarclube.com.br)
Assim como as outras peruas do mercado (Panorama e Parati, por exemplo), a Marajó tem dois volumes, divididos entre o capô e a porção posterior. Esse fato, bem apontado pela saudosa Motor-3 (edição nº 14), aumenta agradavelmente a aerodinâmica do veículo.

Explico-me: como o ar flui de um modo mais limpo, sem criar um redemoinho na traseira, como ocorre no sedan, a penetração aerodinâmica é melhor, o que se traduz num melhor desempenho (e consumo), se compararmos o Hatch ou o Sedan com o mesmo motor.

A Marajó é um carro de linhas simples, sem grandes rebuscamentos.(foto: Motor-3, Agosto de 1981)
Em termos de estilo, a Marajó me agrada, pois tem linhas equilibradas (inclusive com o vidro lateral bipartido, recurso que a Parati, por exemplo, não teve até 1995). A traseira apresenta um desenho simples, bem resolvido, com um amplo vidro traseiro. As lanternas, exclusivas do modelo, são verticais, formadas de três elementos (pisca, luz de freio e luz de marcha à ré).

Se a dianteira não guardava muitas diferenças, a traseira era completamente nova em nosso mercado (foto: Motor-3, via Spinbrothers.blogspot).
Quanto ao tanque de gasolina, a GMB o instalou na mesma posição do Chevette Hatch, pelos mesmos óbvios motivos. E o estepe mora na lateral direita do porta-malas, ocupando espaço no compartimento. Mas isso não era tão grave, se considerarmos que o banco traseiro, tal como no Hacth, era reclinável, abrindo espaço para bagagens maiores, como, por exemplo, uma prancha de surf. Mesmo assim, o espaço interno não era como o da Panorama, forte concorrente nascida no mesmo ano. O eixo cardã, que proporciona um agradável comportamento dinâmico, roubou muito espaço interno, a exemplo do Chevette... Nem tudo é perfeito nessa vida, não é?

O espaço interno não era tão amplo quanto o da Panorama, mas o comportamento dinâmico agradava
(foto: Motor-3, via Spinbrothers.blogspot).
O potencial comprador da perua Chevette tinha duas opções de acabamento (assim como no Chevette Hacth): a versão básica, despida de qualquer luxo, e a SL, topo de linha. E na época do lançamento só estava disponível o honesto motor 1,4. O motor 1,6 só estava disponível em meados de julho daquele ano. Só pra não lançar todas as cartas na mesa de uma vez só, sabem como é.
 
Aí o leitor mais atento pergunta: motor 1,6? É sim, motor 1,6! Essa foi a maior novidade em termos de mecânica para linha Chevette 1981. Mas antes de falar dos demais modelos, é interessante comentar sobre a volta de uma versão esportiva, que já vinha com o famoso motor de 1.600 centímetros cúbicos.

Desde 1979, quando a Chevrolet descontinuou a produção do Chevette GP II, quem desejasse um esportivo da GMB teria de comprar um Opala SS4 ou um SS6. E como o Opala SS entrou pra história em 1980, a fábrica precisava de um esportivo. E o Chevette Hatch parecia bem promissor para essa difícil tarefa.

A GMC, que já estava trabalhando em um motor maior e mais potente, teve um bom lugar pra instalar seu novo propulsor: o cofre do Chevette S/R. Era este o nome da versão esportiva do carrinho.



Em termos de mecânica, o S/R, como já disse, trazia de diferente o motor 1,6 litro e barras estabilizadoras reforçadas, modificações, por elas mesmas, já bem expressivas. No interior, alterações mais sensíveis: padronagem dos bancos diferenciada, volante “esportivado" (o mesmo de quatro raios da linha, mas com o acionador da buzina com desenho diferente) e painel de instrumentos, todos eles vermelhos com fundo branco, reforçado com a presença de um conta-giros (onde ficam os marcadores de nível do tanque de combustível e temperatura do motor nos outros modelos da linha) e de um dispensável vacuômetro; além de um painel auxiliar, instalado acima da alavanca de câmbio, que contém, da esquerda pra direta, um relógio elétrico, termômetro da água do motor, medidor de combustível e voltímetro.
 
Um bom painel, com algumas restrições, é verdade. Mas é um bom painel mesmo assim (Foto: Heitor Hui/QR).
É bem verdade que dois desses instrumentos são perfeitamente dispensáveis: relógio elétrico, que pode morar no pulso do motorista e o vacuômetro, aparelhinho que, em palavras simples, serve pra ajudar na economia. Creio que o comprador de carro esportivo está mais interessado em andar do que economizar, razão pela qual eu trocaria, de boníssimo grado, esses dois instrumentos por um medidor da pressão do óleo. Esta traquitanazinha é muito útil ao desempenho, porquanto avisa quando a unidade motriz está mal das pernas. Vale a lembrança: a pressão do óleo do motor tem a mesma importância da pressão sanguínea. Se estiver abaixo (ou acima) do que deveria, o resultado pode ser perigoso...


O exterior era bem interessante, e se notava fácil que o S/R era diferente dos demais. Apelando para cor preta, com o nítido propósito de fugir dos cromados, a Chevrolet fez um bom trabalho: os para-choques foram pintados nesta cor, assim como a porção inferior da carroçaria. Mas se a cor escolhida pelo comprador fosse preta, a parte inferior da carroçaria (spoilers e laterais) eram pintadas em prata.

Completam a receita S/R um par de faróis de milha na frente, um discreto aerofólio atrás, logotipos “Chevette S/R” em ambas as extremidades do simpático hatch, e acima da faixa preta lateral, um adesivo degradê (ou dégradé, para ficar mais chic) que deixava vazar a sigla “S/R” quando encontrava a roda traseira. Rodas “esportivas” de aro 13 e pneus radiais 175/70SR completavam o pacote.

Resumindo os quatro enormes parágrafos anteriores: 80cv, 0-100 em 16,55s e máxima de 148 km/h (segundo o teste da Quatro-Rodas).

Depois destas versões, vamos falar das alterações da linha 1981. Não são muitas, é verdade, mas não podemos deixar de listar:

a)  os faróis são diferentes. Antes eram redondos, de 81 em diante eram redondos. Uma nova moldura, com contorno cinza (preto na versão S/R), acompanhava a novidade. Nada que revolucionou o mundo, estou certo;

Um grande pequeno detalhe: notem os faróis com novo formato (Foto: GMC, via carplace.virgula.uol.br)
b) adoção da embreagem eletromagnética no acionamento do ventilador do motor. É um dispositivo que a Ford já vendia desde 1979 (se não me engano), e é mais simples do que parece: essa embreagem permite que a ventoinha do motor passe a funcionar apenas quando necessário. Sem essa tal embreagem, o ventilador gira o tempo todo, absorvendo potência desnecessariamente. No Chevette equipado com tal novidade, o ventilador só trabalha quando água do radiador atinge 90°C - e se desliga quando o líquido chega aos 85°C. Moral da história: ganho de 5cv e um consumo melhor;

c) adição de uma válvula de equalização da pressão dos freios no eixo traseiro: essa interessante válvula permite frenagens mais seguras, pois evita desequilíbrio nas freadas ao minimizar o travamento em uma das rodas, peça que também passou a equipar a linha Opala a partir de então;

d) rodas de liga leve: opcionalmente o Chevette e a Marajó poderiam dispor de rodas de alumínio com tala de 5,5 polegadas, equipamento de série no S/R. É a primeira vez que surge na linha Chevette este opcional;
 
e) novas cores, o que não deixa de ser uma novidade;

f) motor a álcool:

O motor e o reservatório de gasolina para partida a frio (Fotos: Heitor Hui/QR).
Essa inovação me obriga a alongar um pouquinho o texto. No começo dos anos 80, o uso do álcool era generosamente incentivado pelo Estado por meio do Programa Nacional do Álcool – Proálcool. Quanto ao acerto (ou desacerto) do tal programa, deixo, ao menos por agora, de tecer minha opinião (embora pense que o João Gurgel tinha carradas de razão em se opor à ideia).

De todo modo, destaco que o álcool foi a solução adotada pra vencer aqueles tempos de alto preço da gasolina e as fábricas tiveram de correr pra se adequar ao novo combustível, alardeado como a salvação nacional do sério problema do preço e a virtual escassez do produto (era época em que posto de gasolina fechava aos finais de semana, numa tal de racionalização do uso da gasolina).

Fiat 147 a álcool, primeiro carro movido pelo combustível vegetal produzido no Brasil (e no mundo, diga-se). Recebeu, pela façanha, o maroto apelido de "cachacinha". (foto: Fiat/Bestcarswebsite).

A Fiat desde 1979 já vendia o seu 147 com motor a álcool, logo acompanhada do Passat da Volkswagen. Por se tratar de uma tecnologia nova, a Chevrolet preferiu testar mais e lançou o seu motor alcoolizado no primeiro trimestre de 1981. A Ford foi ainda mais cautelosa, esperou o último trimestre daquele ano para apresentar seus modelos etílicos.
Mas vamos voltar à linha Chevette, agora a álcool: a fabricante lançou mão do já conhecido motor 1,4l, veterano da linha, e fez as necessárias alterações para receber o combustível vegetal, como, por exemplo, a elevação na taxa de compressão (10,7:1 ante os 7,8:1 da versão a gasolina), novos pistões, readequação do sistema de ignição e de alimentação (tanque de combustível revestido de estanho, tubulação do combustível em plástico polivinílico- PVC- e bomba de combustível bi-cromatizada), sem falar na adoção da ignição eletrônica como item de série.

Todos os itens vieram para deixar o motor confiável e fugir dos fantasmas das desregulagens da carburação e da corrosão que assolavam os pioneiros etílicos. Consumidor, governo e fábricas aprendiam juntos, na prática, como fazer do álcool hidratado um novo combustível.

Ah, e não posso me esquecer do sistema de partida a frio, com botão de acionamento no painel (a tecla morava ao lado do rádio). O tanquinho, com 1,5l de capacidade, tinha até um sistema que fazia acender uma luz no quadro de instrumentos quando estava ficando vazio. É coisa que muito carro moderno da própria Chevrolet não tem...

Resumo da ópera: o motor etílico rendia 1cv e 0,3 kgf/m a mais que a versão a gasolina, embora demonstrasse um consumo mais elevado. Talvez mais elevado do que deveria: segundo o teste da Quatro Rodas (edição de março de 1981) um Chevette Hatch SL gastava, em média, um litro de álcool pra percorrer 8,26km, média não exatamente boa naqueles tempos

Por falar em motores, a Chevrolet os diferenciava na forma de pintá-los. Cada tipo de motor tinha uma cor diferente: 1,4 gasolina era azul, 1,4 a álcool era amarelo e o 1,6 era vermelho. Por falar no 1,6, versão a álcool só em 1983...

g)   por fim, e não menos importante, o novo motor 1,6:

Este motor também merece algumas breves considerações. Equipamento padrão no Chevette S/R e opcional nos demais modelos, o motor 1,6 deu uma nova vida ao carro. Com 1,599 litros de cilindrada, este quatro cilindros, desenvolvido nos EUA, gerava 80cv e 11,6 kgf/m de torque, ante os 68 cv e 9,8 Kgf/m que o 1,4 fornecia.

O 1,6 instalado numa Marajó: era um motor joia! (Foto: Motor-3).
Este novo motor trouxe um agradável fôlego ao Chevette, que já enfrentava a dura concorrência do Gol e do Fiat 147 – e os seus derivados, como Voyage e a Panorama, esta última concorrente direta da Marajó.

Depois deste tópico de dimensões alentadas, exigindo certo fôlego de quem a lê, só me resta informar, como de praxe, a “tiragem” do ano: foram vendidos 69.941 veículos da linha no ano de 1981. E, ainda, acrescentar o teste da revista Quatro Rodas do Chevette S/R, de dezembro de 1980, interessante novidade daquele ano:
 






 
Postagem atualizada em 07/06/2020